Foto: Chris Ferreira. Exposição "Resistir é preciso", CCBB-RJ |
Durante a semana que passou, foi divulgada a notícia do resultado de um estudo feito pelo Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), que revelou que:
65% dos entrevistados acreditam que mulheres que usam roupas que revelem o corpo (curtas, com decotes...) MERECEM ser atacadas
54,9% acreditam que existe "mulher para casar"
58,5% acham que "se as mulheres soubessem se comportar, haveria menos estupros"
Os resultados surpreenderam até os próprios autores da pesquisa, que se espantaram com a ideia de que a violência contra a mulher é vista como uma espécie de "correção", "castigo" por algum comportamento considerado fora do que se julga decente. "Mais uma vez, tem-se um mecanismo de controle do comportamento e do corpo das mulheres da maneira mais violenta que possa existir", dizem. Além disso, existe a confusão do que é privado, que tem que ficar entre quatro paredes, do que é crime e demanda denúncia. As pessoas tendem a acreditar que "em briga de marido e mulher não se mete a colher". Aí é que mora o perigo...
Só ressaltando, a entrevista não foi respondida somente por homens. Mulheres que, pelo que mostram os números, não são poucas, também pensam dessa forma. É um mal que está enraizado e que tem que ser combatido, principalmente com educação e campanhas de conscientização, contra o assédio no trabalho e nos transportes públicos, por exemplo. Meninas são educadas a se privarem de lugares e roupas para se protegerem, aprendendo desde cedo que elas podem ser culpadas por eventuais ataques. Meninos são convencidos que existem "coisas de homem e coisas de mulher" e, como aponta a pesquisa, que "umas mulheres são para casar, outras para se divertir". É preciso acabar com o sexismo e ensinar respeito, especialmente aos meninos. Para depois, esse respeito não ter que ser exigido, ser uma coisa natural.
Esse quadro mostra o quanto nossa sociedade está com os valores distorcidos e, com isso, é cúmplice da violência. Ao mesmo tempo que a grande maioria acha que homem que bate em mulher deve ir para a cadeia, acredita que essa mesma mulher é culpada por sofrer violência. E tem gente (mulheres, inclusive) que dizem que o feminismo é ultrapassado... Pelo contrário!!! Ainda há muito pelo que lutar. As mulheres estão longe da igualdade de direitos. Apesar de estarmos em maior número, somos nós que sofremos violência de todos os lados. Temos que nos afirmar, dia a dia, para poder viver com dignidade.
Conheci há pouco tempo, o termo "sororidade". Da última vez que o li foi há alguns dias, no blog da Isabela Kanupp, num excelente e explicativo post a respeito. Significa um pacto de irmandade entre as mulheres. Cuidar e acolher, em vez de simplesmente acusar. O fato de mulheres terem respondido de forma cúmplice com os opressores, mostra que precisamos parar a e refletir. Continuo acreditando que tem coisa certa e coisa errada, mas, ultimamente, com essa notícia e com outros fatos acontecendo na minha frente, no dia a dia, estou sendo mais flexível, principalmente com o direito de escolha.
A blogosfera, por exemplo, pode fazer muito para ajudar. Lá atrás, quando surgiu o conceito de blog, a ideia era o compartilhamento de informações de forma colaborativa. Surgia um novo meio de saber do que acontece, sem depender da mídia convencional e mais próximo da realidade nossa de cada dia, baseado nas experiências do blogueiro e suas impressões. Hoje, muito disso está se perdendo por causa de guerras de egos e acusações mútuas. Pelo modo de passar essas informações, ridicularizando e oprimindo, em vez de fazê-lo com acolhimento. Eu acho um desserviço textos que, em vez de acrescentar algo de produtivo, estimulam polêmicas desnecessárias e, em vez de acabar com a culpa, como muitas querem que aconteça, estiumulam ainda mais sua cultura. "Ah, a vida de fulana é irreal". Por que? Porque não consigo aplicar o que ela faz à minha vida? Em vez de reclamar, não seria mais bacana tentar ser melhor? Aprender uma com a outra?
Um exemplo bem recente que presenciei foi sobre a questão do parto. Humanizado, normal, cesárea... Há tempos, venho alertando que a militância está "pesando a mão". Eu, mea culpa, já pesei a mão diversas vezes também. Só que, com o tempo, consigo enxergar onde errei, aprendendo a dosar.
São possibilidades. Sabemos do alto número de cesáreas e que a grande maioria dos médicos obstetras induz a mulher à cirurgia, muitas vezes sem necessidade e sem levar em consideração o que ela deseja. É esse o ponto. Escolhas!!! Sejam antecipadas, sejam na "hora H", por diversos motivos que vão surgindo pelo caminho. Informações sobre o parto humanizado podem e devem ser compartilhadas. Toda mãe e criança merecem respeito nesse momento tão especial. A violência obstétrica é uma triste realidade. Muita coisa tem que ser mudada em todo o sistema. Mas, além de compartilhar informações, deveriam também humanizar a própria militância. Muitas vezes, em vez de informar, julgam, rotulam e até ofendem. Toda mulher tem direito à escolha. Seja para aceitar a corte de uma pessoa, para abortar, para decicir ter seu filho e também para escolher sobre seu parto.
Com certeza, empoderar-se não é somente parir pela vagina. É muito mais que isso. A mulher pode, sim, ser plena e feliz trazendo seu filho ao mundo através de cesárea, por exemplo. E o mesmo pode ocorrer com a criança, sendo amamentada, sentindo-se amada e acolhida. O parto é só o início.Temos toda a vida pela frente, para fazer as melhores escolhas. E é com esse pensamento que devemos seguir, que devemos educar nossas crianças. Informação empodera. Respeito e acolhimento também.
Nem toda feiticeira é corcunda,
Nem toda brasileira é bunda,
Meu peito não é de silicone
Sou mais macho que muito homem!