quinta-feira, 20 de março de 2014

O outono, a roda do ano e o ciclo da vida

Acervo pessoal

E a roda do ano mais uma vez gira e minha estação favorita chega. A luz, a (no Rio, pequena) queda de temperatura, as cores... Adoro o outono! Mabon, para os antigos. E, para quem é de Peixes, também é época de aniversário. Recomeço. Roda girando... Nesse ano, os 40 vieram com mudanças. Dolorosas mudanças. Entre elas, a partida de mamãe.

No último domingo, quando me vi recebendo condolências, a ficha caiu. Ainda sou filha! Ainda sou criança que veste a máscara de adulto para que a sociedade leve a sério.

Acervo pessoal

Desde o momento em que me tornei mãe, esse passou a ser meu papel em família. Minha relação com ela não era fácil, nunca foi. Mas, nesse momento, tornou-se mais tensa. Nos afastamos. Minha família passou a ser marido e filhos. Até que a vida uniu de novo a família sanguínea. E ela voltou a morar comigo. Mesmo assim, eu ainda era a mãe, a matriarca. No momento que começaram a chegar as mensagens de pêsames, eu me lembrei do papel esquecido. Lembrei de minha infância, dela brincando comigo e com meu irmão, correndo pela casa, da mesma forma que hoje, muitas vezes, faço com meus filhos. De seu jeito torto de tentar me fazer entender as coisas da vida, para que eu não passasse pelo que ela passou. De suas diversas maneiras tortas de me ensinar. Como Regina e Cora (quem assiste "Once Upon a Time" entenderá...).

Fique tranquila, mãe, você conseguiu, apesar da ogra aqui ser muito cabeça dura para ter admitido isso para você. Aliás, isso também eu aprendi com você.

Acervo pessoal

Mamãe partiu desse mundo, dormindo, sentada no sofá, enquanto aguardava eu arrumar as coisas para seu banho. Saiu à francesa, com uma serenidade que nem de longe a lembrava em seus áureos tempos, linda, elegante, cheia de jóias e dona de si. Aquela música, "Dona", do Roupa Nova, a explica muito bem.

Ela descansou, no sentido mais literal possível. Vaidosa e orgulhosa que era, não admitia as limitações que lhe foram impostas.

Ela "se pirulitou" de uma vida que não mais a interessava. Ela era assim. Muitos podem pensar: o câncer, a debilitação decorrente tanto do tratamento, quanto do fato dela ter "se entregado" e a acelerada senilidade, também consequência, a venceram. Enganam-se. Ela venceu. Ela quis partir. Ela já queria ter ido há tempos. Mas não deixamos. Bastou uma distração e ela fez o que quis. Chamou pelo seu orixá de cabeça e ele a levou, gentilmente.

Um dia, ela foi a menina sonhadora que ainda sou. Só que, em algum momento, ela deixou que a menina se perdesse. E "não adianta chamar, quando alguém está perdido, procurando se encontrar".

Nessa vida, fracassei na missão de sermos amigas. Não importam agora os motivos e de quem foi a culpa. Mas consegui ser filha. Da que dá trabalho, da que dá desgostos, mas também da que dá orgulho. Porque isso eu sei que você teve de mim, diversas vezes. Seja nos estudos, numa apresentação de dança, fazendo um gol, educando um de meus filhos ou fazendo uma comida para todos num domingo. Você conseguiu passar seu recado, embora eu várias vezes tenha dito que aprendi a viver sozinha.

Adeus, mãe! <3

Acervo pessoal

For this dark and lonely room
Projects a shadow cast in gloom
And my eyes are mirrors
Of the world outside
Thinking of the ways
That the wind can turn the tide
And these shadows turn
From purple into grey

For just a skyline pigeon
Dreaming of the open
Waiting for the day
He can spread his wings
And fly away again



iStock



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